Market Spotlight

Cabotagem no Brasil em 2021

Como muitos países, o Brasil restringe a navegação entre portos domésticos à entidades nacionais. Apenas empresas brasileiras de navegação (EBNs) podem se envolver na cabotagem.1 Em meados de 2023, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) contabilizou 49 empresas registradas como EBNs que operavam navios na cabotagem.2 Aqui destacamos aspectos do mercado em 2021, quando os registros informam que havia 185 navios na frota de cabotagem do Brasil; estes eram principalmente barcaças, manuseadores de espias (embarcações que operam no descarregamento do petróleo das instalações de produção e armazenamento para os navios petroleiros e destes para as monoboias), porta-contêineres e navios-tanque. Cerca de 60% da capacidade total de transporte estava associada à indústria de petróleo e gás. Para todos os segmentos, algumas empresas detinham a maior parte da frota e das operações.

1Lei nº 9.432, de 8 de janeiro de 1997, https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9432.htm.

2 Ver detalhes das fontes de dados no final deste documento.

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Tonelagem de 2011 a 2021

Os granéis líquidos e gasosos representaram cerca de 77% da tonelagem total de cabotagem no Brasil entre 2011 e 2021, ao passo que os granéis sólidos totalizaram cerca de 12% da tonelagem, a carga conteinerizada, 7%, e a carga geral, 3%. Nesse período, a tonelagem de granéis líquidos e gasosos cresceu 53%; a tonelagem de granéis sólidos, 7%; e a tonelagem de carga geral, 10%. A tonelagem de carga conteinerizada foi a que mais aumentou, 230%.

Granéis líquidos e gasosos

Do total de granéis líquidos e gasosos transportados, 98,6% eram combustíveis minerais, óleos minerais e produtos de sua destilação. O restante eram produtos químicos orgânicos (0,6%), produtos químicos e substâncias inorgânicos (0,4%), e bebidas, licores e vinagre (0,2%). A maior parte provinha de plataformas offshore de extração de petróleo na Zona Econômica Exclusiva (ZEE) brasileira, e os principais destinos eram os estados de Rio de Janeiro e São Paulo, na Região Sudeste, que abrigam grandes refinarias de petróleo.3 Dez EBNs possuíam navios para transporte de granéis líquidos e gasosos, sendo que a Petrobras Transporte S.A.—Transpetro detinha 68% da frota (26 navios) e 93% da capacidade total de transporte nesse segmento. A Empresa de Navegação Elcano S.A. detinha 16% da frota (seis navios) e 3% da capacidade total, enquanto a Flumar Transportes de Químicos e Gases Ltda. detinha 5% da frota (dois navios) e 3% da capacidade total. Outras empresas tinham menos de 1%.

3 Empresa de Pesquisa Energética, Balanço Energético Nacional 2022: Ano Base 2021 [Brazilian Energy Balance 2022: Year 2021] (Rio de Janeiro, 2022), https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-675/topico-638/BEN2022.pdf.

Granéis sólidos

A cabotagem de granéis sólidos, fortemente ligada ao setor da mineração, teve como principais produtos minérios (91% do total de toneladas transportadas), sal (6%) e combustíveis minerais sólidos (1%). O transporte de granéis sólidos por cabotagem está concentrado no norte do Brasil, carregando principalmente bauxita, o terceiro recurso natural mais abundante no país.

Quatro empresas atuavam na cabotagem de granéis sólidos: a Elcano S.A detinha 50% da frota (quatro navios) e 56% da capacidade total de transporte; a Lyra Navegação Marítima detinha 25% da frota (dois navios) e 10% da capacidade de transporte; a Hidrovias do Brasil detinha 13% da frota (um navio) e 23% da capacidade total de transporte; e a Norsul detinha 13% da frota (um navio) e 10% da capacidade de transporte. Como o transporte de bauxita é baseado em contratos de longo prazo e em uma frota específica, há pouca concorrência para as EBNs que operam nesse mercado.

Carga conteinerizada

Três EBNs, cada uma com seis navios registrados, atuavam nesse segmento e colaboravam para oferecer múltiplos serviços: Aliança Navegação e Logística, Log-In Logística Intermodal e Mercosul Line. A Aliança detinha 44% da capacidade de transporte, seguida pela Log-In (30%) e pela Mercosul Line (26%). Todas são subsidiárias de corporações internacionais. A Mediterranean Shipping Company (MSC) detém participação majoritária na Log-in Logística Intermodal, a Aliança faz parte da AP Moller – Maersk, e a Mercosul Line integra o Grupo CMA CGM. Essas EBNs oferecem operações feeder que transferem cargas estrangeiras para importação ou exportação, parte importante dos serviços de cabotagem. Seis produtos representaram 51% do total de toneladas de carga conteinerizada relacionada à cabotagem; somados a outros 14 produtos, eles representaram 80% do total. O transporte de cargas conteinerizadas está mais distribuído pelo Brasil que o dos demais tipos de carga. Os principais pontos de origem e destino estão em todas as regiões ao longo da costa.

Carga geral

Desde 2011, a participação da carga geral na tonelagem total de cabotagem no Brasil vem diminuindo constantemente. Dois itens representam mais de 90% da cabotagem de carga geral: produtos siderúrgicos (70%) e celulose (22%), principal matéria-prima para a fabricação de papel. Produtos florestais, como madeira e carvão, são o terceiro item mais comum, mas representam apenas 3% do total de toneladas transportadas. Sete navios (de um total de dez) e duas EBNs responderam por 99% da capacidade de transporte: a Tranship Tranportes Marítimos Ltda. detinha cinco navios e 24% da capacidade de transporte, enquanto a Norsul possuía dois navios e 75% da capacidade de transporte. As principais origens e destinos da cabotagem de carga geral estão associadas a produtos siderúrgicos transportados do Espírito Santo (Região Sudeste) para Santa Catarina (Região Sul); produtos florestais e celulose transportados da Bahia (Nordeste) para o Espírito Santo (Sudeste); e produtos siderúrgicos do Ceará (Nordeste) para São Paulo (Sudeste).

Investimento em descarbonização

O programa BR do Mar, incorporado na Lei nº 14.301/2022, atualizou a legislação para aumentar a oferta e qualidade dos serviços de cabotagem no Brasil bem como promover a competitividade das EBNs, especialmente no segmento de cargas conteinerizadas.4 Além disso, a empresa que possui e opera a maior parte das embarcações em atuação na cabotagem no Brasil, a Transpetro, pretende reduzir em 11% as emissões de seus navios e investir R$ 64 milhões em esforços de descarbonização até 2027.5 Entre seus projetos planejados, a empresa lista revestimentos de alta tecnologia no casco dos navios para prevenir incrustações por organismos marinhos (reduzindo assim o consumo de combustível e as emissões de gases de efeito estufa); o emprego de algoritmos avançados para identificar as rotas de navegação mais eficientes; a otimização da combustão do motor principal; e o uso de misturas de biocombustíveis.6 Ademais, as principais companhias internacionais de transporte de contêineres que controlam ou possuem empresas em operação na cabotagem no Brasil divulgaram metas de sustentabilidade. Esses objetivos incluem a descarbonização de suas cadeias de abastecimento globais. A Tabela 1 exibe as metas de descarbonização divulgadas pelas empresas.

Tabela 1. Metas de descarbonização das principais empresas internacionais de transporte de contêineres e suas subsidiárias brasileiras.

Corporação internacional

EBN subsidiária

Metas de descarbonização relacionadas ao transporte marítimo internacional

Mediterranean Shipping Company (MSC)

Log-In

• Atuar ao longo da cadeia de valor da MSC para promover os investimentos necessários ao alcance da neutralidade de carbono em todas as operações, desenvolver soluções de apoio logístico e focar na eficiência energética. 

•Trabalhar com as partes interessadas para promover o uso de combustíveis alternativos, incluindo a infraestrutura e os sistemas de distribuição necessários.

AP Moller – Maersk

Aliança

Meta de descarbonização para 2030 em conformidade com a estratégia de 1,5º C da Science Based Targets Initiative (SBTi) para obter reduções absolutas de emissões entre 35% e 50% a partir da linha de base de 2020. 

•Meta de atingir a neutralidade de carbono até 2040 em todos os âmbitos e negócios.

Grupo CMA CGM

Mercosul Line

• Em seu relatório de Responsabilidade Social Empresarial de 2022, a empresa afirmou o objetivo de alcançar a neutralidade climática para a Mercosul Line até 2050, tendo pelo menos 10% de combustíveis alternativos em sua matriz energética até 2023 e atingindo 100% de eletricidade renovável em armazéns logísticos até 2025. 

•Buscar iniciativas que incluam usar combustíveis alternativos em navios e projetar embarcações com maior eficiência energética.

Como a frota de cabotagem do Brasil transporta principalmente materiais para a indústria de petróleo e gás, as estratégias para descarbonizar o transporte marítimo nacional exigirão a participação e o apoio desse setor. Uma análise recente mostrou que navios de abastecimento e porta-contêineres são as classes de embarcações responsáveis pela maior parte das emissões na ZEE brasileira.7 Ademais, o envolvimento das empresas que operam no segmento de navios de abastecimento e porta-contêineres será crucial para a implementação de medidas nacionais de descarbonização.

4 Lei nº 14.301, de 7 de janeiro de 2022, https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/l14301.htm.
5 Transpetro, “Transpetro investe em Eficiência Energética e Descarbonização da sua Frota,” news release, 23 ago. 2023, https://transpetro.com.br/transpetro-institucional/noticias/transpetro-investe-em-eficiencia-energetica-e-descarbonizacao-da-sua-frota.htm.
6 Transpetro, Relatório de sustentabilidade 2022, https://sustentabilidade.petrobras.com.br.
7 Francielle Carvalho, Recommendations to Develop a Brazilian Maritime National Action Plan (Washington, DC: International Council on Clean Transportation, 2023), https://theicct.org/publication/recommendation-to-develop-a-brazilian-maritime-national-action-plan-aug23/.

Data sources and methodology

As informações apresentadas nas figuras foram obtidas nos bancos de dados da ANTAQ. Essa agência é responsável por regular, supervisionar e fiscalizar as atividades de prestação de serviços de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e aquaviária. Duas bases de dados da ANTAQ foram consultadas em abril e maio de 2023: Estatístico Aquaviário e Navegação Marítima – Frota Geral – Analítica.

Os sites das empresas de navegação também foram consultados, mas, quando houve divergência entre as bases de dados da ANTAQ e os relatórios das empresas, priorizaram-se os dados da ANTAQ. Por exemplo, existem diferenças entre os dados da frota de porta-contêineres nas bases da ANTAQ e as informações fornecidas pelas três EBNs em seus websites. Para a frota de carga geral, também identificamos diferenças entre os dados da ANTAQ e os das empresas. A base da ANTAQ contém informações sobre embarcações de carga geral que se misturam com barcaças que podem não estar operando no setor de carga geral. Por exemplo, embora a frota da Tranship esteja incluída na base de dados de carga geral da ANTAQ, a empresa atua mais no setor de petróleo e gás com barcaças de convés aberto.8 Os dados da ANTAQ indicam que as empresas do segmento de carga geral operam com barcaças de convés aberto destinadas ao transporte de cargas especiais e não de carga geral; algumas dessas barcaças estão associadas à indústria de petróleo e gás. O site da Norsul informa que a empresa atua no segmento de carga geral com uma frota de barcaças e rebocadores destinados ao transporte de celulose e produtos siderúrgicos.9 Assim, para assegurar a consistência com os demais segmentos de transporte de cabotagem apresentados nesta análise, todos os dados apresentados nas figuras foram obtidos na base da ANTAQ.

A propriedade das EBNs foi obtida das seguintes fontes:

  • Michele Labrut, “Log-In Logistica Accept MSC Takeover Offer,” Seatrade Maritime News, 23 dez. 2021, https://www.seatrade-maritime.com/ containers/log-logistica-accept-msc-takeover-offer.
  • “Aliança—A Maersk Company,” acesso em jun. 2023, https://www.alianca.com.br/a-alianca.
  • “Especialistas em Cabotagem e Logística,” Mercosul Line, acesso em jun. 2023, https://www.mercosul-line.com.br/.

 

8 “Frota,” Tranship, acesso em abr. 2023, http://www.tstranship.com.br/frota.html

9 “Navegação – Cabotagem e Longo Curso,” Norsul, acesso em jun. 2023, https://www.norsul.com/servicos/navegacao/.

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